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Pra ver a banda passar…

Orquestra de Sopros de Pindoretama | Foto: Thomas Panzau

Por Luciana Bento

“Estava à toa na vida

O meu amor me chamou

Pra ver a banda passar

Cantando coisas de amor”

(A Banda – Chico Buarque)

Quem nunca ouviu este verso, que remete à imagem de uma bucólica cidade, cheia de personagens típicos e uma atmosfera lúdica e musical? Embora o olhar sensível e criativo do poeta descreva uma cena imaginária, o cenário – com toda as variações que a diversidade de culturas e realidades permite – existe e está muito vivo em centenas de cidades brasileiras.

De acordo com levantamento feito pela Funarte (Fundação Nacional das Artes, autarquia ligada ao Ministério da Cultura), existem nada menos do que 3.032 bandas de música espalhadas por 1.964 municípios brasileiros.

Em sua grande maioria sediada em pequenas cidades, espalhadas pelo interior do País, a banda de música muitas vezes é o único equipamento cultural do município e, além de concorrida atração musical, faz às vezes de centro de formação de instrumentistas e maestros.

Uma delas encontra-se em Pindoretama, cidade de pouco mais de 20 mil habitantes no interior do Ceará. Formada por cerca de 50 músicos, a Orquestra de Sopros de Pindoretama já conta com quatro turnês na Europa, tocando em festivais na Alemanha e na Noruega, e mais de 600 concertos em seu currículo.

“Nossa orquestra atua como uma escola, formando seus próprios músicos, no interior do Ceará”, explica o maestro Arley França, fundador da orquestra. “As crianças ingressam no programa a partir dos 10 anos e permanecem até atingir a maioridade. Há 18 anos comecei sozinho, ensinando todos os instrumentos. Hoje, os alunos da primeira turma já são adultos, formados – a maioria em música – e atuam como professores da orquestra”, conta.

Faz parte do programa a formação em instrumentos de sopro como flauta, oboé, clarineta, fagote, saxofone, trompete, trombone, bombardino, tuba e também instrumentos de percussão. Hoje a Orquestra de Sopros de Pindoretama atende mais 250 alunos em sua escola de formação musical, além dos 50 músicos que formam a orquestra principal.

“Embora a lei que institui a música como conteúdo obrigatório no ensino básico tenha sido sancionada, o que se viu foi o seu descumprimento. As bandas de música estão a todo vapor, atuando como escolas de música em suas comunidades, formando instrumentistas e incluindo socialmente crianças e jovens”, analisa o maestro Arley – que é doutor em Educação e coordenador do Sistema Brasileiro de Bandas e Orquestras.

Manutenção e financiamento

É de se perguntar como as bandas  – com suas múltiplas funções – se mantém, são financiadas e sobrevivem, já que muitos equipamentos culturais têm fechado as portas ou reduzido suas ações por falta de recursos.

“As bandas de fato sobrevivem com muito pouca estrutura diante do papel relevante que cumprem nas regiões onde atuam”, avalia Rosana Lemos, coordenadora de Bandas do Centro de Música da Funarte.

“Muitas se mantém com o esforço e a paixão dos maestros e músicos, que se mobilizam e se desdobram para que elas funcionem. Poucos governos estaduais disponibilizam políticas públicas específicas para as bandas de música, é preciso criar editais e linhas de fomento para que esta tradição não se perca”, explica.

Desde 1976 a Funarte mantém o Projeto Bandas de Música, que realiza painéis de intercâmbio e formação de músicos, com cursos como manutenção e reparo de instrumentos, regência, percepção musical, instrumentação e arranjos e fundamentos para instrumentos de sopro, entre outros.

“Muitas bandas contam com maestros autodidatas, que passam sua arte e tradição para seus alunos”, conta Rosana. “Isso não pode morrer, mas é preciso investir na formação e capacitação dos jovens músicos que estão chegando e os painéis ajudam a cumprir este papel”.

O Projeto Bandas de Música da Funarte também lança editais para compra e distribuição de instrumentos, tendo beneficiado 3.086 bandas com 40 mil instrumentos de sopro desde 1978. O último edital aconteceu em 2013 e está suspenso por falta de recursos.

Séculos de tradição

Embora se mantenham vivíssimas, as bandas são organizações musicais bem antigas, com registros históricos que datam de centenas de anos, em inúmeros países, como explica o professor de Regência de Banda e Prática de Orquestra da Escola de Música da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Marcelo Jardim.

“A partir da Revolução Francesa, o papel das bandas como formadora de músicos e propagadora de cultura musical foi elevado a um patamar de destaque, com a organização de grupos com centenas de músicos, para apresentações ao ar livre e salas de concertos”, explica.

“No Brasil, tínhamos as primeiras bandas formadas por escravos, nas fazendas, e também os “ternos” barbeiros – ou banda de barbeiros músicos, nas cidades -, e isso perdurou até a primeira metade do século XIX, quando aqui chegaram músicos vindo com a corte portuguesa”.

No entanto, as primeiras bandas mais bem estruturadas foram as bandas militares que, com recursos para contratar e formar músicos profissionais, passaram a participar de todo tipo de festejo: quermesses, procissões, festas religiosas e mesmo em bailes festivos como entrudos e Carnaval.

Tudo isso no século 19 e 20. Mas e no século 21, uma época onde o mundo está conectado, com tantas influências e acesso a sons, ritmos e estilos, por que uma tradição secular se mantém tão viva e atraente – inclusive para os jovens, que se dedicam de forma disciplinada aos ensaios e estudos?

“Sou regente de bandas há 22 anos e percebo que, mesmo concorrendo com ferramentas da vida moderna como as redes sociais e internet, as bandas ainda são uma oportunidade de profissionalização para muitos jovens”, conta o maestro Arley, de Pindoretama. “Elas também proporcionam um ambiente onde trabalhar em equipe é essencial e é um espaço de entretenimento. Acredito que a mistura desses elementos contribui para que a cada dia mais e mais jovens queiram participar das bandas de música”, diz.

Ele ainda ressalta que os jovens que buscam as bandas geralmente não tem condições de pagar uma aula de música particular. “Neste sentido, a música representa para eles também uma possibilidade de transformação, de mudança de vida”, arremata.

Para o professor Marcelo Jardim, este interesse advém ainda de uma peculiaridade do ensino de música. “Apesar dos avanços tecnológicos e comportamentais de nosso tempo, a tradição na formação musical exige um aspecto mais humanizador, um estímulo sensorial e afetivo, de forma a envolver a criança e o jovem nesse universo de sons que a música nos traz”, avalia.

Seja como for, as bandas estão aí: nas ruas, praças, coretos e também – por que não? – teatros, clubes, salas de concerto e casas de espetáculo. Elas estão ocupando espaços públicos e levando música de qualidade para a população, de forma gratuita e sem grandes produções – no melhor estilo “todo artista tem que ir aonde o povo está”, como propaga a letra de Bailes de vida, de Milton Nascimento e Fernando Brant.

“Assim tem sido ao longo de séculos”, informa o professor e maestro Marcelo Jardim. “A democratização da música envolve uma série de outros fatores, educacionais e culturais – mas sim, a presença da banda nas festividades, solenidades, em projetos de concertos didáticos, concertos para as famílias e desfiles, tudo isso junto forma um bonito painel de ações diretamente realizadas pelas bandas e que atuam no processo democratizante da cultura”, finaliza.

Bom para o público, que não se cansa de ver a banda passar, “cantando coisas de amor”.

Para conhecer mais:

Banda Sinfônica Antônio Malato de Ponta de Pedras, na Ilha do Marajó, Pará

Banda Filarmônica de Cruzeta, Rio Grande do Norte

Banda de Música de Sobral, Ceará

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