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Relação criador e criatura

Foto: Adriana Pitigliani/Divulgação

Por Luciana Bento

O dicionário nos ensina, entre outras coisas, que composição é o ato de constituir um todo. Ou seja, a partir da soma das partes chega-se a um conjunto – espera-se – coerente, harmônico, bonito, melodioso.

Então é só colocar uma palavrinha aqui, algumas notas ali, acrescentar uma melodia acolá, achar o tom certo, definir o compasso, misturar bem os ingredientes e… voilà! Temos uma linda canção à nossa frente.

Bem… mas um pouco mais adiante o nosso amigo dicionário introduz mais alguns elementos nesta equação e especifica que, no caso da música, a obra é elaborada de acordo com as regras da arte. Regras? Complicou um tantinho, né?

Embora o ato de compor esteja intrinsecamente ligado à criatividade, à inspiração, a referências musicais anteriores e mesmo a lampejos de ideias, muitas das canções lindas e geniais que ouvimos por aí são compostas a partir de muita TRANSpiração.

O compositor e integrante do grupo Prelúdio 21, Sérgio Roberto de Oliveira, é um exemplo disso . O grupo é formado por compositores que fazem apresentações mensais executando apenas criações de músicos contemporâneos – um estímulo para que novas canções sejam produzidas e apresentadas para um público fiel que frequenta os shows.

Sérgio, um dos fundadores do grupo, mantém há anos uma rotina diária de composição e não pretende parar: “É um exercício. Componho todos os dias e não apenas quando ‘bate uma inspiração’. Claro que, como tudo na vida, tem dias que você tem boas ideias, tem dias que não está tão inspirado assim. Mas acredito que a prática diária da composição é absolutamente necessária”, defende. “É como um instrumentista: tem que treinar para alcançar a excelência, melhorar a performance”.

Ele conta que iniciou esta relação diária com a composição quando entrou na universidade e começou a ser incentivado pelos professores a criar canções, fazer exercícios em casa e utilizar estruturas pré-estabelecidas de construção de frases musicais.

“Existem técnicas que são utilizadas e aperfeiçoadas há séculos, lições de grandes mestres da música e também, por que não?, criadas e ensinadas por compositores contemporâneos. Seria um desperdício não aproveitarmos todo este conhecimento e potencial para compor novas canções”, pondera Sérgio.

Isso significa que só os estudiosos e conhecedores das técnicas conseguem e podem compor? A resposta é não e aí estão mestres do samba como Pixinguinha, Cartola, Noel Rosa, Lamartine Babo e compositores caipiras como Tonico e Tinoco e Pena Branca e Xavantinho – todos autores de clássicos inquestionáveis da música popular brasileira – que não nos deixam mentir. Mas a julgar pela produção abundante destes bambas, fica claro que mesmo estes geniais compositores mantinham uma rotina de composição.

Criação sem preconceito

Engana-se quem imagina que este processo só vale para composições eruditas ou músicas mais sofisticadas. Sim, porque tem gente que torce o nariz para gêneros como o funk, por exemplo. Funkeiro compositor? Nem pensar!

O DJ de funk Sany Pitbull, na estrada há 30 anos, já sentiu na pele este preconceito. Hoje, procurado por artistas estrangeiros e nacionais para compor canções, com agenda de shows lotada e participação em festivais pelo mundo afora, ele relativiza as caras feias e cumpre um papel de embaixador do funk na música brasileira.

Quando recebeu a reportagem da Revista Tuhu, Sany – que toca na banda do músico Lulu Santos – estava compondo uma música para a cantora Gaby Amarantos, musa do tecnobrega. “Vejo o funk um grande liquidificador, onde você pode colocar muitos ingredientes. Assim como uma vitamina, você precisa medir bem cada coisa: muito açúcar estraga a vitamina, assim como leite demais pode deixa-la sem gosto”, simplifica Sany.

“A batida do funk pode entrar em qualquer ritmo, até numa música dos Rolling Stones. Para mim a música é tempo, é compasso. Pode ser mais rápido ou mais lento, mas é o tempo que conta. Respeitando esta premissa, você pode colocar a batida do funk em qualquer instrumento, qualquer ritmo”, diz, revelando sua técnica.

O processo de Sany, que também compõe com regularidade e já perdeu a conta de quantas músicas produziu, é curioso: como não toca nenhum instrumento, ele compõe no computador – onde escolhe batidas, ritmos, instrumentos – e só depois grava “na vida real, com instrumentistas de verdade”.

O caminho de Miguel Bevilacqua é diferente mas também ilustra o quanto a dedicação é importante para o ato de compor. Aos 22 anos, ele estuda violino e violoncelo desde os 12 anos e hoje cursa Música na UniRio, seguindo o incentivo da família, que sempre foi ligada à música (a avó foi pianista na juventude).

Com acesso, desde muito jovem, a compositores eruditos, Miguel não só compõe peças para música de câmara, como redige as canções à mão – prefere não usar o Finale, programa de computador predileto dos compositores.

“A primeira peça que compus foi um experimento para um duo que eu tinha com uma amiga oboísta. Como o repertório para essa formação não é muito vasto, eu escrevi essa peça que depois se tornou uma suíte completamente escrita em tons inteiros”, conta. “Gostei muito da sensação de possuir uma composição inteiramente criada por mim. Logo comecei a compor muitas peças para violoncelo solo e música de câmara, que é o que eu mais gosto no universo da música”, diz, queixando-se de estar compondo pouco atualmente por conta dos compromissos acadêmicos.

Embora a técnica seja uma aliada da composição, fatores como interesse, treino e bagagem musical são fundamentais para esta que é uma parte um tanto negligenciada do ensino de música. Afinal, tocar um instrumento e interpretar canções acabam sendo a parte mais visível da cadeia musical e nem sempre o autor é o que recebe os louros pela obra.

“O limite entre uma composição e um improviso de qualidade pode ser tênue, esta é uma questão inclusive estudada por muitos autores, tem muita gente boa discutindo isso”, explica Sérgio de Oliveira. “Mas, grosso modo, podemos dizer que o improviso é um fluxo criativo de ideias e uma composição é algo mais estruturado, pensado, coerente e, por isso mesmo, com mais chance de ser repetido”.

Genial, inovadora, criativa, plagiada, remixada… Há composições aos montes sendo feitas, criadas e divulgadas neste vasto mundo da comunicação digital. O próprio mercado demanda criações inéditas, seja para games, animações, trilhas de cinema, publicidade. O espaço hoje não se restringe aos artistas que se apresentam nos palcos e gravam suas músicas.

Recorremos mais uma vez ao dicionário para nos ajudar a compreender este universo tão mágico quanto metódico. E ele nos informa que composição é algo que remete a uma produção autoral, da lavra de alguém, que assina e assume a responsabilidade sobre aquela criação. Uma verdadeira impressão digital, pessoal e intransferível.

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