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A importância da música na primeira infância
Por Helena Rodrigues e Paulo Maria Rodrigues*
É na primeira infância que se aprende mais e melhor. Nos últimos tempos vários estudos têm demonstrado que as experiências dos primeiros anos de vida são cruciais para o desenvolvimento intelectual e afectivo do ser humano. Privações e danos verificados neste período de vida são muito difíceis de superar.
As experiências musicais na infância têm grande importância não só para futuros desempenhos musicais mas também para o desenvolvimento das capacidades sensoriais em geral da criança. Os afectos e o desenvolvimento relacional que estruturam qualquer personalidade podem também ser eficazmente mediados através de experiências de carácter musical.
Lembremo-nos que o desenvolvimento das capacidades sensoriais e a estruturação equilibrada da personalidade são alicerces para aquisições cognitivas posteriores. Assim, quando se defende um contacto precoce com a música pretende-se criar condições para que a criança venha a compreender a música e ser capaz de comunicar as suas próprias ideias musicais.
De acordo com Edwin Gordon, cujas ideias tivemos o privilégio de introduzir em Portugal em 1994, o meio envolvente deve oferecer estímulos musicais ricos e diversificados, proporcionando à criança um percurso de aprendizagem semelhante ao da aquisição da língua materna.
Para que venha a ser capaz de pensar musicalmente. Para que venha a ser capaz de formular ideias musicais próprias podendo ir cada vez mais longe no âmbito da sua imaginação sonora, quer se trate de uma situação de audição musical, de execução num instrumento, de improvisação, de composição, de leitura ou de escrita musical.
O nosso trabalho tem sido igualmente muito inspirado por Colwyn Trevarthen, com quem temos tido o privilégio de contactar mais de perto desde 2002, e por outros autores que defendem que os princípios da aquisição da linguagem e do desenvolvimento da competência musical podem ser indistintamente abordados no quadro da interacção familiar, como formas de comunicação humana na primeira infância.
Concretizando: cantar, embalar, dar pequenas palmadas, brincadeiras que têm a ver com o movimento e a dança, são formas primárias de comunicação que simultaneamente incentivam a aquisição da língua materna e o desenvolvimento da competência musical. Ou seja, a comunicação pré-verbal que se estabelece entre pais e filhos é importante, quer em termos linguísticos como em termos de estimulação musical.
Os pais devem ter presente que a interacção humana é fundamental nas aprendizagens. As pequenas brincadeiras que os adultos fazem com a própria voz, com sons vários e com o corpo, quando se acercam de um bebé (a que o bebé responde ou provoca de variadas formas) são formas primárias de comunicação. A linguagem verbal e a expressão musical, características únicas do ser humano, são faces emergentes da mesma necessidade de estar em contacto com o mundo.
Em Portugal, existe um crescente interesse pelas orientações musicais na primeira infância. E é deveras entusiasmante que isto esteja a acontecer. Contudo, é crucial alertar vivamente para a importância da participação dos pais neste processo, “relembrando” a eles e aos educadores formas “musicais” de se relacionarem com os seus pequeninos.
Na sequência das ideias expostas, alguns dos trabalhos da Companhia de Música Teatral, da qual somos fundadores, têm justamente, a preocupação de imaginar espaços educativos em que pais, educadores e artistas compartilhem a expressão artística, reencontrando na prática musical um espaço de comunicação que se espera poder extravasar para o seu quotidiano.
Esta filosofia esteve muito presente ao longo de todo o Projecto Opus Tutti (http://www.opustutti.com ) e estará também no novo projecto apoiado pela Fundação Calouste Gulbenkian – o projecto Germinarte, que começa a dar os seus primeiros passos com a acção de formação imersiva Jardim Interior (www.musicateatral.com/germinarte).
Algumas das ideias subjacentes a este trabalho estão retratadas no documentário realizado no âmbito do projecto Opus Tutti (https://vimeo.com/98671246) . Efectivamente, muitas boas práticas para a infância criadas no âmbito deste projecto irão agora ser aperfeiçoadas para se poder melhorar as práticas de formação nesta área.
*Helena Rodrigues é diretora artística da Companhia de Música Teatral e professora do Departamento de Ciências Musicais da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, Portugal.
* Paulo Maria Rodrigues é compositor residente da Companhia de Musica Teatral e professor do Departamento de Comunicação e Arte da Universidade de Aveiro, Portugal.